P.Guedes de Carvalho
No âmbito de uma iniciativa levada a cabo por um grupo de estudantes da Faculdade que dirijo e que se auto designa por GEP (grupo de estudos políticos), realizou-se ontem uma palestra com o orador Dr. Paulo Morais, reconhecido professor e ex-vereador de uma autarquia grande que tem dedicado a sua vida nestes últimos anos ao combate público da corrupção e à defesa da transparência como instrumento prioritário de combate a este mesmo flagelo.
Em primeiro lugar queria salientar a excepcional qualidade da oratória: calma, tranquila, clara, segura, assertiva, cuidadosamente fundamentada e fortemente adequada ao público presente. O mesmo assunto e os inúmeros exemplos utilizados não poderiam ser melhor explicados em qualquer outro formato. Simplesmente brilhante.
Em segundo lugar será de referir que o número e a gravidade dos exemplos iam-nos deixando progressivamente angustiados de tal forma que, o orador, sentiu e utilizou quebras fundamentais de ritmo que nos permitiram aguentar mais um bocados. Desejar ouvir dizer que haveria uma luz ao fundo do túnel. Isso é mestria na captação da atenção do auditório.
E dos conteúdos o que dizer?
Houve ideias chave claras que passarei a referir: i) a crise tem como raiz a corrupção; ii) a corrupção é um flagelo ancestral na nossa cultura e já referida no programa do MFA, logo anterior ao 25 de Abril e finalmente; iii) a corrupção está forte e positivamente correlacionada com o atraso no desenvolvimento dos países onde ocorre.
No fundo sempre fomos um povo atrasado, geramos sistemas de funcionamento favoráveis à corrupção e não nos desenvolveremos nunca sem resolvermos ou estancarmos as consequências deste sub-sistema no sistema social e económico mais global. Nós vivemos bem com os favores, dos pequenos aos grandes. De alguma forma esta é uma característica de sociedades pequenas caracterizadas por relações interpessoais densas onde as pessoas nunca sabem o quanto vão precisar dos seus vizinhos e por isso tomam “cautelas” nas suas atitudes. Somos também um país que viveu muitos anos debaixo de opressão o que favorece que apreciemos o “xico espertismo”, o desenrascado e aquele que não se submete. No fundo um excelente indicador de potencialidade de empreendedorismo. Com o 25 de Abril crescemos em liberdade sem freio o que criou uma espécie de sensação de “podemos fazer tudo e qualquer coisa”, entre outras coisas usarmos os bens públicos como se de uma vingança do passado se tratasse; dito de outro modo, já que nos exploraram e oprimiram tanto agora vamos sugar o que pudermos que alguém irá pagar. E a Europa veio a calhar para gastar à fartazana.
O problema é que quem mais se aproveitou com isso foi a Banca que, estando nas mãos de gananciosos banqueiros e muitos maus gestores de balcão deu ordens de emprestar e conceder crédito acima das possibilidades privadas de pagamento. Estes arriscaram-se a entrar em negócios sem ter que apresentar garantias ou apresentando garantias de terrenos e casas com valores claramente inflacionados para conseguir o crédito. Hoje, essas casas não valem metade mas pagam-se como se valessem. Quem paga? Os privados à banca que os explorou e continua a explorar.
Estamos por isso arrumados.
E luz haverá?
Disse que sim. Começando por exigir maior transparência nas contas, mais justiça, melhores e mais tribunais temáticos (por exemplo tribunais especializados em corrupção) e, last but not least recuperação das verbas com que os corruptos enriqueceram para atenuar a dívida que todos nós estamos a ser obrigados a pagar (miseravelmente).
Obrigado Paulo Morais. Muita força para prosseguir com a sua Associação pela Transparência que, muito bem, tem estado a blindar e resiste as regionalizações e delegações que poderiam abrir caminho aos corruptos que nelas entrariam para também as corromper.
Por: Pedro Guedes de Carvalho
