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NADA, PARA ALÉM DO INEVITÁVEL …

Ernani Balsa

Ernani Balsa

Pior do que nada pensar é pensar nada. É pensar um vazio desmotivador e castrador de soluções, perspectivas ou alternativas. É refugiarmo-nos no silêncio da reflexão e nada encontrarmos que quebre esse silêncio do pensamento, do exercício de construirmos saídas para a nossa crise, que é essencialmente uma paralisia cerebral da nossa capacidade de debatermos as nossas próprias insuficiências e reconhecermos defeitos, erros, desvios, excessos, intolerâncias e dogmas e mesmo um certo tipo de desonestidades intelectuais e inaceitáveis insuficiências de análise social, porque nos fechamos para além do aceitável, nas nossas muralhas de certezas, sem sequer termos a coragem de espreitarmos por entre as ameias das dúvidas que sempre existem.

Pior do que não saber para onde vamos, é não saber o que queremos. Mas sabê-lo com a abertura suficiente para aceitarmos todas essas insuficiências e esses defeitos e sentirmos uma verdadeira vontade de procurar encontros, mesmo antes de reconhecermos as diferenças, que sempre existirão.

No rescaldo de duas semanas tão intensas quanto amorfas, as pessoas esperavam algo, esperavam uma consequência racional ou coerente que abrisse novos caminhos ou, no mínimo, clarificasse o impasse que surgira. Pura e simplesmente, o que aconteceu foi o nada! O nada, mais uma vez, tomava conta de tudo. Estranha forma de vida, esta, que aceita o nada quando para além deste vazio existe um mar de tudo… Falta-nos iniciativa para arriscarmos o que quer que seja, para rompermos esta situação ínvia e indigna de nos termos aceite enclausurados num qualquer protectorado económico e político, que nos trata como uma nação reconquistada por infiéis e bárbaros, novos e frios invasores, depois de sermos tidos como a nação independente mais antiga da Europa, com fronteiras definidas e território uno e indivisível.

Não está em questão o reconhecimento dos nossos erros e a assumpção das nossas obrigações e responsabilidades perante terceiros, mas uma coisa é conjugar esforços para repararmos o que correu mal e outra é esvairmo-nos nos efeitos, primários ou secundários, do tratamento que nos é imposto. Nenhum povo se regenera na pobreza e na perda da sua dignidade e aqueles a quem entregamos a responsabilidade de conduzir os nossos destinos, confiando na sua boa-fé, arte e engenho e também no seu patriotismo, não nos podem defraudar, deixando-se subjugar em todas a frentes, recusando-se terminantemente e fazer valer a nossa condição de país livre e independente, mesmo embora com contas a prestar. Podemos, na nossa diversidade partidária e ideológica, duma democracia que, mesmo ainda jovem, se sente convicta da sua escolha, aceitar diferentes visões da economia e da sociedade em geral, mas não podemos nem devemos abdicar da nossa obrigação de usarmos todos os instrumentos possíveis para encontrar um equilíbrio saudável, justo e motivante, entre as obrigações que sobre nós pendem e a capacidade de resistência aos sacrifícios que nos impõem, para que consigamos recuperar a nossa solvência financeira, sem no entanto, ferirmos de morte a nossa dignidade e a nossa condição de nação, pertencente, sim, a uma Comunidade Europeia, mas mesmo assim independente.

Um povo não tem que se submeter a terapias, por mais politicamente correctas que sejam, se essas terapias atentarem contra a sua dignidade e identidade. Um povo tem características e história, tradições e valores, que se misturam entre passado, presente e futuro, que podem evoluir, adaptar-se ou ganhar novas dimensões, mas não pode nem deve renegá-las no essencial. O facto de termos aderido a uma comunidade que julgámos benéfica para uma harmonia social e cultural, e depois política também, não nos obriga a abdicarmos da nossa marca genética, enquanto povo. Imagine-se o que seria, se por conveniência ou desvario político, Portugal tivesse que relegar para segundo plano a sua língua pátria para adoptar o inglês, quiçá o alemão, como língua oficial?… Assistiríamos até, porventura, a uma certa receptividade por parte de certas camadas fanaticamente europeístas de algumas elites políticas e não só, mas seria um crime de lesa pátria. Nada que não se possa, no entanto, considerar como passível de vir a ser equacionado num futuro que a maior parte do país certamente repudiaria, mas já estivemos mais longe. A sanha uniformista e irresponsável de quem julga ser proprietário duma nação, só porque foram legitimados pelo voto, poderia ter a veleidade de se julgar no direito de transformar a sua vontade na escolha de toda a sociedade. Temos, por isso, de estar atentos, de não desistirmos de sermos o povo que somos e de lutar pela continuidade da nossa independência a todos os níveis daquilo que é mais supremo numa nação, a sua dignidade, a sua integridade, a sua identidade, a sua língua e a capacidade de podermos sempre dialogar com os outros e defender aquilo que constitui a prerrogativa de nos protegermos, como povo.

Poderemos até desafiar a lei das probabilidades e pagar aquilo que devemos, não se sabe quando, mas convém não nos alhearmos que na economia mundial ninguém empresta nada sem colher daí frutos que não se esgotam nos pagamentos da dívida. Antes de a saldarmos, já aqueles que nos facultaram e até propuseram os empréstimos, de algum modo tiraram dividendos.

Depois dos dias turbulentos em que todos pensariam que algo de novo iria acontecer, continuamos a ter o mesmo governo, com o mesmo discurso e algumas promessas açucaradas para dar a ideia de que alguma coisa mudou. Pura demagogia. Muitos reconhecem que seria possível renegociar as condições do programa de assistência a que estamos sujeitos, mas o governo recusa terminantemente essa possibilidade, como se o destino fosse uma equação que apenas tem uma solução. Como se tudo fosse derradeiramente inevitável. Por isso mesmo, vivemos agora sob a ditadura do nada, quando o que se exigiria seria uma democracia em que tudo pudesse ser posto numa nova equação aberta a uma resolução de todas as possibilidades exequíveis.

A maioria das pessoas não são de esquerda ou de direita, são apenas Portugueses que gostariam de ser governados por homens e mulheres sérios, honestos, com carácter, capazes de defender os interesses de todos. Os partidos, com raras excepções, não têm a dimensão dos votos que colhem nas eleições, uma vez que as pessoas votam porque que têm de escolher alguém. Os Portugueses escolhem e votam nos partidos por uma questão de cidadania, porque acham que devem contribuir para soluções boas para todo o povo, mas cada vez vão perdendo mais confiança nas escolhas dos partidos, ou no mínimo, dos partidos que se guindaram à posição de serem elegíveis porque mentem com mais maestria. Os partidos vivem à custa da dimensão do seu ego, mas raramente sabem corresponder à confiança que as pessoas ainda neles vão depositando, porque o seu principal objectivo não é o bem público, mas outros jogos de interesses que o povo, a pouco e pouco, vai entendendo. Por isso a abstenção cresce de eleição em eleição. Os Portugueses precisam do esforço de todos os agentes políticos para voltarem a acreditar na política, como a solução para um país melhor… Não precisam nem merecem que apenas lhes prometam tudo e lhes devolvam nada!…

Pior do que nada pensar é pensar nada! Nada, para além do inevitável…

Por: Ernani Balsa
“escreve sem o acordo ortográfico”

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