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O PREÇO DO TRABALHO

Hernani_Balsa

Ernani Balsa

Quando hoje em dia pensamos no trabalho, como meio de subsistência, mas também como realização humana e espiritual, logo nos deparamos com o confronto entre a sua necessidade, a nível económico e o não menos necessário direito ao lúdico, uma vez que o homem não se resume apenas a um instrumento de mão-de-obra, mas também a um ser inteligente e criativo e espiritual com requisitos ao nível do entretenimento, da cultura e do lazer.

A evolução da sociedade teve sempre como objectivo declarado, um equilíbrio razoável e progressivamente apurado, entre essa necessidade de prover a economia de meios de desenvolvimento e criação de riqueza e o direito cada vez mais reclamado de que as pessoas tivessem tempo e meios para usufruir da vida, em toda a sua extensão e diversidade, não só criando processos laborais mais fáceis e eficientes, como criando-lhes espaço temporal e meios económicos que lhes possibilitassem gozar a vida e dedicar às famílias ou aos grupos sociais em que se inserem, o tempo suficiente para que paralelamente pudessem realizar-se lúdica, espiritual e culturalmente

É notório esse esforço ao longo do tempo, principalmente na sequência da revolução industrial, que trouxe novos métodos de produção, indústrias cada vez mais mecanizadas, centros de produção em grande escala e um reconhecimento da importância do salário, assim como dos direitos dos trabalhadores. Os sindicatos e outras organizações de direitos sociais e laborais vieram estabelecer a urgência de diálogo entre quem efectivamente produzia à custa do seu suor e quem financiava essa produção, levando ao legítimo reconhecimento da importância de patrões e empresários, mas igualmente de trabalhadores e assalariados, num esforço comum de produzir, de acordo com as necessidades do progresso, mas também de pagar esse esforço condignamente a quem tinha nas mãos a responsabilidade dessa produção. E assim, o poder de compra aumentou, os resultados do progresso puderam estender-se a muito mais gente, incluindo aqueles que anteriormente eram vistos apenas e quase como escravos do trabalho, os horários de trabalho foram sendo progressivamente regulados e as novas gerações tiveram acesso a uma educação melhorada e com objectivos mais determinados pelas necessidades de se continuar a construir um futuro que abrangesse um número crescente de cidadãos. Tornou-se imperativo que, apesar de continuarem a existir classes de maiores ou menores recursos financeiros, o mundo do trabalho não se resumisse a dois grupos, constituídos por aqueles que detinham o capital, o investiam e beneficiavam dos lucros gerados e os outros que, com a força do seu trabalho, o suor e as dificuldades, contribuíam com o seu esforço para a riqueza dos patrões e quase nada recebiam de retorno.

Viajando desde esses tempos até hoje, fácil será concluir que o actual paradigma não assenta já nos mesmos princípios e valores. Será mesmo legítimo assumir que nas últimas décadas, mas com mais incidência já neste século, a importância do trabalho sofreu uma mutação perniciosa e, se bem que em muitas áreas, ele tenha assumido uma dimensão cada vez mais respeitada e gratificante, na generalidade, o peso e importância, não obrigatoriamente benéficos, da alta finança, do dinheiro, e de toda a especulação à volta deste mundo quase virtual e autofágico, teve como resultado uma desvalorização do trabalho não altamente qualificado, mas indesmentivelmente imprescindível à continuidade do equilíbrio entre os diversos sectores da sociedade. A sobrevalorização das novas tecnologias, aliada à voracidade imparável do sector financeiro neo-liberal, que se tem vindo a assumir quase como uma “indústria da vacuidade produtiva”, crente de que o dinheiro, por si só, pode criar mais riqueza e não apenas mais uma vã sustentabilidade dos países, tem como resultado que quem não se movimente nesse estranho mundo dos “papeis”, das “operações”, dos “produtos financeiros e especulativos”, das “taxas de juro”, dos “spreads”, dos ”swaps”, dos “ratings” e outras quantas designações, não tem direito a viver com dignidade e a aspirar a um futuro melhor. Ressalve-se talvez a área das novas tecnologias, nomeadamente as da comunicação e informação ou então da investigação, que dada a sua elevada importância na busca de novas soluções tecnológicas, conseguem manter-se numa vanguarda mais confortável assente na inovação. A tendência, no entanto, é pagar menos, exigir mais, aumentar os horários de trabalho e a idade de reforma e acusar aqueles que apenas vivem do esforço do seu trabalho, de viverem acima das suas possibilidades, enquanto os grandes senhores do mundo acumulam riquezas incalculáveis, à custa do trabalho alheio e da banalização da corrupção aos mais variados níveis.

É pois, neste contexto, que a nova realidade, desenhada por economistas e políticos, determinou que o preço do trabalho, com excepção daquele que lhes serve directa e decididamente os seus propósitos frios e vorazes, terá que baixar drasticamente. E isto, porque o dinheiro que assim poupam, permite-lhes exercer impunemente a sua ganância, multiplicando dinheiro e mais dinheiro, numa espiral que apenas alimenta um número restrito de fortunas obscenas e não geradoras de bem comum, não hesitando para tal, jogar com as condições de vida e o futuro de povos e países, empobrecendo-os, como se se tratasse de um mero jogo de xadrez, onde o xeque-mate não se resume a uma simples vitória, mas sim ao aniquilar de perspectivas de vida e de crescimento para os países mais fracos e os trabalhadores indefesos, perante uma justiça que apenas defende quem tem poder financeiro para recorrer aos tribunais.

O preço do trabalho baixa de dia para dia porque o preço da riqueza cresce na mesma proporção. É claro que temos cada vez mais ricos… mas temos incomensuravelmente mais pobres todos os dias. Obrigado, geniais economistas e governantes, mas alerto-vos que vocês estão somente a ser os veículos para essas riquezas. Continuam a habitar no quarto dos fundos desse mundo que julgam vosso… Não passam de mangas-de-alpaca daqueles que se julgam os senhores do mundo, dos quais a Senhora Merkel é apenas a vizinha do lado, que cria as condições necessárias ao empobrecimento de todos nós…

Por: Ernani Balsa
“escreve sem acordo ortográfico”

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