Palco de figuras incontornáveis da sociedade e cultura, nacionais e internacionais, restaurante icónico de Lisboa lança resumo das histórias gravadas nas paredes.
Francisco Oliveira, o famoso “Oliveira”, dono do Farta Brutos, e anterior empregado do Tavares Rico, deixou ao filho, Rogério Oliveira, e ao amigo, Ivan Dias, uma entrevista feita em vida onde, pela primeira vez, revelou as inúmeras histórias que fizeram do Farta Brutos um dos mais icónicos restaurantes lisboetas do último século.
As famosas pataniscas de bacalhau, hoje apelidadas de Pataniscas à Saramago, as Sardinhas à Cardoso Pires, ou o Arroz de Línguas de Bacalhau, foram alguns dos pratos que levaram muitos dos escritores, fadistas, artistas, políticos, jornalistas, empresários, entre outras figuras importantes da sociedade portuguesa e internacional, ao Farta Brutos. Mas Francisco Oliveira foi muito além do serviço e da melhor gastronomia lusa, fazendo história com um espaço que seria, hoje, mais eficaz que qualquer rede social.
Francisco Oliveira começou a sua carreira na restauração no famoso Tavares Rico que o viu crescer. Passou pelo Gambrinus, pelo Tágide, mas tinha a ambição de ter o seu próprio restaurante. O Farta Brutos surge na sua vida após ter sido comprado pela sociedade que detinha o Tavares Rico, passando a chamar-se, então, Tavares Pobre. “Venho para o Farta Brutos quando o Fernando Lopes se chateou com isto. Não correspondeu à expectativa que ele tinha desses clientes e alguns ditos fascistas aderirem completamente a esta ideia de passarem a frequentar o Farta Brutos. Eu já lhe tinha manifestado interesse de um dia arranjar uma coisinha para mim e ele disse “olha que eu vendo-te o Farta Brutos. Arranja dinheiro, arranja um sócio!”, explica, na entrevista editada em livro, Francisco Oliveira. “E foi quando eu falei com o Ramiro e combinamos. Ele também andava com essa essa expectativa de arranjar uma coisinha. Mas faltava o dinheiro! (…) todos os dias almoçava lá um dos patrões do Orey Antunes, o senhor Salvador Antunes. E ele também tinha a ideia de ter um restaurantezito. E disse “se isto se concretizar vocês vão já lá implementar um prato que é o Bacalhau à Brás”. Naquela altura não se falava. Era uma novidade. Ele lá nos pediu para apalpar o terreno e ver quanto é que aquilo custava. Ele ia ser o nosso sócio”, explica Francisco Oliveira. “Acho que 1990 ficamos definitivamente com isto. Foram cinco anos para comprarmos as cotas e mais cinco para comprarmos o espaço. A comida sempre foi ótima e começamos a apanhar a emergente classe média. E foi nessa gama que o Farta Brutos funcionou nos trinta anos seguintes…”, acrescenta.
“Lembro as rezas gastronómicas sempre cómicas e as graças dadas antes de uma bela cabeça de pescada cozida que ele sempre tinha o prazer de me ver comer… Isso e as terrinas inteiras de sopa nos meus períodos vegetarianos que muito o arreliavam… abria a porta e gritava para a rua “Venham ver, venham ver: o homem que come uma terrina inteira de sopa!”. Era também na rua, sentado à porta e com a vinha como cenário, que pouca uva dava, mas conferia alguma patine à fachada, que, a ler o jornal ou simplesmente a ver quem passava, ia discorrendo estórias com os populares que por ali deambulavam e o admiravam”, refere Ivan Dias, amigo de longa data da família Oliveira. “A conversa que neste livro está registada aconteceu um ano antes do Oliveira partir para a derradeira viagem. Sempre tive a sensação que de fato as pessoas vivem eternamente entre nós se delas ficar memória viva cotidiana. Uns dias depois da partida sonhei com ele. Como sempre acontecia entre nós a conversa foi rápida concisa e direta. Sem rábulas. Perguntou-me ele “Ficou tudo bem não foi? Achas que já me posso ir embora? Agora é convosco! Até logo!”.
Livro à venda em exclusivo no Farta Brutos. PVP – 25euros.