O dia 24 de Março de 1999, marca um ponto de viragem na segurança contra incêndios em túneis, a forma de combater incêndios no interior destas infraestruturas, a segurança de pessoas e o seu resgate.
Estou a falar do famoso incêndio no Túnel de Mont Blanc (ligação rodoviária entre França e Itália nos Alpes), na sequência de um incêndio num camião. Incêndio que durou 53 horas, e destruiu 24 camiões, 9 veículos ligeiros e duas viaturas dos bombeiros. No total morreram 39 pessoas entro os quais, um bombeiro francês e um socorrista italiano.
O incêndio ocorrido no passado dia 11 no Túnel do Marão, não deixa de nos assaltar a mente com várias questões que já eram alvo de discussão e interrogações mesmo antes da inauguração da referida infraestrutura.
No quero de maneira nenhuma vir a publico classificar com adjectivos qualquer pessoa, organização ou entidade mas, contribuir para uma análise técnica em todas a vertentes com algumas interrogações muito simples e do conhecimento geral, pois também os dados que tenho foram recolhidos nas imagens e declarações feitas por diversos responsáveis e intervenientes.
1.O sistema de ventilação em uma galeria subterrânea tem como objectivo em caso de acidente/incêndio em primeiro lugar garantir que os fumos avancem no sentido contrario das viaturas bloqueadas, de forma a garantir uma ventilação com ar fresco do exterior.
Assim, empurrar para o exterior os fumos, gases tóxicos e asfixiantes libertados pelo incêndio.
Posteriormente e depois de confirmado que não há ocupantes no interior, o sentido da ventilação poderá ser alterado, ou mesmo anulada, de forma a cortar o aporte de oxigénio ao incêndio.
O que vimos nas imagens televisivas e não só, foi que o fumo esteve a sair precisamente no sentido Norte/Sul, ou seja, mesmo para a área onde se encontravam veículos bloqueados e os seus ocupantes.
Porquê?
2.Ouvimos o Comandante dos Bombeiros que fizeram a intervenção, referir que com facilidade o incêndio foi extinto.
As fotos mostram um autocarro totalmente consumido pelo incêndio, mesmo a sua estrutura ficou totalmente deformada pelas altas temperaturas que naturalmente foram atingidas no túnel. Por esta razão, os danos resultam numa demorada avaliação, recuperação e reparação que levam a interdição de utilização do túnel.
Será que os bombeiros estiveram em combate ao incêndio?
Ou se extinguiu pelo consumo de todos os materiais inflamáveis?
Tinham condições para o fazer?
Muito mais interrogações se poderiam fazer em relação ás saídas e percursos de emergência e a coordenação da circulação em ambos os sentidos da infraestrutura.
No entanto, como português, considero que há males que vêm por bem, senão vejamos:
O evento vem colocar a necessidade de rever e avaliar de novo a segurança e a resposta a uma emergência no Túnel do Marão. Há que considerar muitos cenários que podem ocorrer a qualquer momento e provocar uma catástrofe , alguns exemplos muito simples:
.Ocorrência de um incêndio que coincida com a circulação de viaturas de mercadorias com materiais perigosos.
.Eventos com congestionamentos, pessoas bloqueadas e impossibilitadas de realizar a sua fuga e a necessidade dos bombeiros realizarem resgate de inúmeras vitimas em ambiente contaminado.
e muito mais…
Depois de evento do Mont Blanc e muitos outros parece que por cá, continuamos a confiar na protecção divina.
Será que o IP (Infraestruturas de Portugal) não deverá classificar o Túnel do Marão com uma INFRAESTRUTURA CRITICA e proceder em conformidade?
Desta vez não tivemos vitimas e só se registaram danos materiais, se houvesse mortos a “culpa morreria solteira” como sempre?
Por ultimo, é possível que os acontecimentos dos fogos façam com que este evento passe para 2º plano ou mesmo para o esquecimento, de certeza que muitos responsáveis já estão á espera que isso aconteça.
Armando Pereira
Especialista em Segurança e Resgate Mineiro