No passado dia 3 de dezembro, registaram-se protestos dos Sapadores Bombeiros junto à Sede do Governo em Lisboa. Gostaria de abordar este tema, reconhecendo, desde já, que o uso de tochas e petardos durante a manifestação foi um exagero e acabou por ser um “tiro no pé” para a causa.
Este incidente serviu como justificação para o Governo suspender as negociações com os Sapadores, uma decisão que considero desproporcionada, incoerente e injusta.
Se analisarmos outras situações semelhantes, especialmente no âmbito das forças de segurança, vemos critérios bem diferentes.
Ação de forças de segurança e tratamento diferenciado
Em novembro de 2013 e outubro de 2018, elementos da PSP, GNR e CGP ultrapassaram as grades de segurança e subiram as escadarias da Assembleia da República, obrigando os cordões policiais a recuar. Esses atos foram amplamente considerados como “simbólicos” e “espontâneos” pelas autoridades, sem grandes consequências para os envolvidos.
Mais recentemente, em fevereiro de 2024, após uma concentração na Praça do Comércio, manifestantes decidiram avançar para o Capitólio, cercando o teatro onde decorriam debates eleitorais entre Pedro Nuno Santos e Luís Montenegro. Apesar da gravidade da situação, associações sindicais e estruturas representativas desmarcaram-se dos atos e referiram que estas ações tinham caráter inorgânico. Não houve suspensão de negociações com as forças de segurança nem penalizações significativas.
Comparação injusta com os Sapadores Bombeiros
O uso de petardos e tochas pelos Sapadores Bombeiros foi tratado como um incidente gravíssimo, mais severo até do que a greve recente dos técnicos do INEM às horas extraordinárias, durante a qual morreram dez pessoas. É impressionante a discrepância de tratamento.
No caso do Capitólio, foram instaurados dezenas de processos disciplinares contra elementos da PSP, mas muitos acabaram por ser arquivados. Agora, a PSP apresentou queixa-crime contra vários Sapadores Bombeiros identificados perto do Campus XXI, o que indica que processos disciplinares e penalizações para estes profissionais são praticamente inevitáveis. Esta diferença de critérios levanta questões importantes sobre a justiça e coerência nas decisões governamentais.
As justas reivindicações dos Sapadores Bombeiros, bem como a sua revolta e cansaço, eram previsíveis, especialmente tendo em conta as recentes decisões do Governo relativamente às forças de segurança. Estas decisões criaram um sentimento de desigualdade e discriminação. Ao agir com esta dualidade de critérios, o Governo está, na verdade, a alimentar a insatisfação e a contribuir para o aumento da revolta entre estes profissionais.
Exemplo atual: progressões na PSP
Para agravar ainda mais a sensação de desigualdade, o Governo anunciou recentemente que vai clarificar e implementar as progressões na carreira da PSP, com os pagamentos a serem feitos ainda este mês. Enquanto isso, os Sapadores Bombeiros veem as suas negociações suspensas, num contraste que apenas reforça a perceção de injustiça.
O que é necessário?
É urgente mais diálogo e uma postura governamental mais justa e coerente. Somente através de uma abordagem equilibrada será possível apaziguar os ânimos e evitar que incidentes isolados sirvam como pretexto para medidas extremas. O atual cenário, infelizmente, reflete bem o título deste artigo: somos todos iguais, mas há sempre uns mais iguais do que outros.
Armando Pereira
Consultor e Formador
Professor na Pós-Graduação Gestão e Direção de Segurança / Autónoma Academy