Vivemos numa sociedade em que o preço anunciado raramente é o preço real. Seja na reserva de um carro de aluguer, numa fatura de telecomunicações, numa passagem aérea ou até num crédito bancário, há sempre custos escondidos, taxas de serviço, suplementos e encargos imprevistos. A economia do detalhe transformou-se numa indústria de extrações invisíveis.
Em Portugal, vemos isto no dia-a-dia:
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um aluguer de automóvel que, depois de pago, obriga a seguros nunca mencionados na reserva;
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um pacote de telecomunicações que sobe silenciosamente porque uma promoção caducou;
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um banco que, apesar de lucros recorde, inventa comissões sobre transferências ou manutenção de conta.
Estas práticas não são erros. São modelos de negócio. Jogam com a confiança limitada dos consumidores, exploram o cansaço regulatório e apostam na ideia de que poucos contestarão valores aparentemente pequenos.
Mas somemos tudo: cinco euros aqui, vinte euros ali, trinta e quatro euros por dia acolá. No fim do ano, o “extra” não é irrelevante. É uma segunda renda, um imposto privado cobrado por empresas com a conivência da falta de fiscalização.
O padrão repete-se no estrangeiro
Na Europa, a guerra da Ucrânia trouxe outro tipo de custo oculto: inflação estrutural, energia cara e aumento de impostos indiretos. O cidadão paga duas vezes — no supermercado e no silêncio político que adia soluções duradouras.
Nos Estados Unidos, a política transformou-se também numa economia de custos ocultos. A disputa eleitoral permanente absorve a energia do país e deixa a fatura para o resto do mundo. Uma América instável significa mercados instáveis, energia instável, segurança instável.
No Médio Oriente, a tragédia de Gaza é acompanhada por outra distorção: uma diplomacia internacional que anuncia paz, mas entrega mais guerra. O preço oculto aqui não é em euros, mas em vidas humanas.
Em Portugal o efeito é ainda mais cruel
Temos salários estagnados, habitação proibitiva e serviços públicos cada vez mais frágeis. E em vez de se proteger o cidadão, inventam-se novas formas de o desgastar: burocracias intermináveis, impostos indiretos, portagens que aumentam sem transparência, combustíveis sujeitos a taxas que ninguém percebe.
Enquanto isso, empresas monopolistas lucram e bancos distribuem dividendos. O cidadão comum vê-se encurralado entre a promessa e a realidade, entre o preço anunciado e o preço final.
O verdadeiro risco: erosão da confiança
A maior perda não é monetária. É política. Quando as pessoas deixam de acreditar que o contrato — seja comercial, social ou político — é claro e honesto, abre-se espaço ao populismo, à raiva e à descrença na democracia.
Hoje, em Portugal e no mundo, o que mais falta não são leis ou regulamentos. Faltam líderes que apliquem a lei de forma justa, transparente e eficaz. O preço tem de ser final. A palavra tem de ser vinculativa. A política tem de ser credível.
Se não invertermos esta tendência, viveremos sempre assim: a pagar uma fatura invisível, a acreditar em promessas que nunca se cumprem, a perder confiança nas instituições.
E um país sem confiança é um país à deriva.
Lino Gonçalves
Diretor de Informação