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ENTENDER A CORRUPÇÃO NO SECTOR PÚBLICO

         “HĂĄ polĂ­ticos pobres que ao fim de uns anos estĂŁo milionĂĄrios.”
Maria José Morgado

C.F.C.

C.F.C.

O dicionårio de Língua Portuguesa da Porto Editora, define Corrupção como sendo o acto ou efeito de corromper, estado do que se vai corromper, putrefacção, perversão, desmoralização, prevaricação, adulteração, suborno, sedução.

Verificamos nesta abordagem primĂĄria que o tema Corrupção, Ă© deveras extenso e que se banha em ĂĄguas dĂșbias e de mĂșltipla origem, desta forma, iremos direccionar o nosso escrito confinando-o aos charcos do Sector PĂșblico.

No sector em causa, a Corrupção Ă© o fenĂłmeno pelo qual um funcionĂĄrio pĂșblico Ă© levado a agir de modo diverso dos padrĂ”es normativos do sistema, tendo em vista o favorecimento de interesses particulares em troco de recompensa.

Corrupto Ă©, portanto, o comportamento ilegal de quem desempenha um papel na estrutura do Estado.
Podemos distinguir trĂȘs tipos elementares de Corrupção, entre outros:
1.    a prĂĄtica do uso de recompensa escondida para mudar a seu favor o sentir de um funcionĂĄrio pĂșblico;
2.    nepotismo ou concessĂŁo de empregos ou contratos pĂșblicos, alicerçado nas relaçÔes de parentesco e/ou amiguismo e nunca no mĂ©rito;
3.    o peculato por desvio ou apropriação de fundos pĂșblicos para uso privado.

Consideraremos entĂŁo, a Corrupção em termos de legalidade e ilegalidade e nunca a observaremos em termos de moralidade e imoralidade, porque temos de ter em conta as diferenças que existem entre prĂĄticas sociais e normas legais, bem como, na diversidade de avaliação dos comportamentos que sĂŁo distintos, quer no sector privado, quer no sector pĂșblico. Por exemplo, se um Director Geral de uma empresa privada colocar um seu familiar num cargo de responsabilidade e/ou de chefia sem os requisitos mĂ­nimos para o desempenho cabal da função, nĂŁo estĂĄ a praticar um acto de nepotismo, mas, pelo contrĂĄrio, se este cenĂĄrio fizer parte do palco de uma qualquer empresa pĂșblica, outros valores se levantarĂŁo e aqui sim, reĂșnem-se todos os pressupostos para considerarmos como tal.

Assim,

Corrupção Ă© o acto ou o efeito de se corromper, oferecer algo, com o objectivo de obter vantagem em qualquer negociata, vindo a favorecer uma pessoa e a prejudicar outra, ou seja, Ă© a existĂȘncia de uma transição ou troca entre quem corrompe e quem se deixa corromper e como Ă© Ăłbvio, quanto maior for o “Poder” dos intervenientes, maior serĂĄ a vantagem obtida.

Nesta relação de promessa versus recompensa, em troca de um comportamento que favoreça os interesses do corruptor, raramente  se ameaça com punição a quem lese os interesses deste. No fundo, a Corrupção é uma alternativa da coerção, mas, quando as partes são muito poderosas hå uma incapacidade de a utilizar.

A Corrupção Ă© uma forma especĂ­fica do exercĂ­cio da influĂȘncia ilĂ­cita, ilegal e ilegĂ­tima, enquadrando-se perfeitamente no funcionamento de um sistema e em particular, no modo como se tomam as decisĂ”es, isto Ă©, quanto maior for a institucionalização tanto maior serĂĄ a possibilidade do comportamento corrupto, por isso, a ampliação do sector pĂșblico em relação ao sector privado provoca o aumento da possibilidade de Corrupção. Mas, nĂŁo Ă© sĂł a amplitude do sector pĂșblico que tem influĂȘncia nessas possibilidades, tambĂ©m o ritmo com que se expande tem de se ter em consideração. Verificamos que em ambientes com estabilidade institucional, os comportamentos corruptos sĂŁo menos frequentes e mais visĂ­veis do que em ambientes com institucionalizaçÔes parciais ou flutuantes.

NĂŁo nos podemos esquecer de que a Corrupção nĂŁo estĂĄ somente ligada apenas ao grau da institucionalização, Ă  amplitude do sector pĂșblico e ao ritmo das mudanças sociais, mas estĂĄ tambĂ©m, relacionada com a cultura das elites e das massas, no fundo, depende da apreensĂŁo que tende a alterar-se no tempo e no espaço.

Se assumirmos que a Corrupção Ă© um modo de influenciar as decisĂ”es pĂșblicas, quem dela se serve, geralmente procura intervir em trĂȘs nĂ­veis diferenciados:
1.    a este nĂ­vel a Corrupção Ă© utilizada antes de tudo, isto Ă©, efectiva-se na fase de elaboração das decisĂ”es. Aqui Ă© o espaço de eleição para actividades dos grupos de pressĂŁo para influenciarem os deputados, os membros das comissĂ”es parlamentares e os peritos. Os grupos que recorrem a este tipo de Corrupção, de uma forma geral, apresentam representatividade dĂ©bil, nĂŁo tĂȘm acesso aos “decision-makers” (tomadores de decisĂŁo). A este nĂ­vel a Corrupção tambĂ©m pode ser utilizada para a obtenção de um acesso privilegiado;
2.    a este nĂ­vel a Corrupção estĂĄ direccionada Ă  aplicação das normas por parte da administração pĂșblica e respectivas instituiçÔes. O objectivo, neste nĂ­vel, Ă© o de obter uma isenção ou uma aplicação de qualquer modo mais favorĂĄvel, serĂŁo tanto maiores as probabilidades de ĂȘxito, quanto mais elĂĄstica e vaga for a formulação de normas;
3.    a este nível a Corrupção pode ainda ser usada quando se faz valer a Lei contra os transgressores. Neste nível, a Corrupção tem por objectivo fugir às sançÔes legalmente previstas.

Estes trĂȘs nĂ­veis mencionados anteriormente estĂŁo direccionados, respectivamente; ao parlamento, ao governo e burocracia e Ă  magistratura.

Nas sociedades fragmentadas e heterogĂ©neas, o fenĂłmeno da Corrupção acentua-se com a existĂȘncia de um sistema representativo imperfeito e com o acesso discriminatĂłrio ao “Poder” de decisĂŁo. A elite governativa tem aqui um papel fundamental porque quanto mais se sentir segura de conservar ou reconquistar o “Poder” por meios legais ou recear ser punida pela utilização de meios ilegais, tanto menor serĂĄ a Corrupção, mas, quanto mais ameaçada se sentir, tanto mais a elite recorrerĂĄ a meios ilegais e Ă  Corrupção para se manter no “Poder”.

É bastante relevante e notĂłrio, os efeitos da Corrupção no funcionamento num sistema polĂ­tico, isto Ă©, se a Corrupção estĂĄ largamente espalhada e Ă© parcialmente aceite pelas massas, incluindo nas relaçÔes com as elites, as suas consequĂȘncias podem nĂŁo ser inteiramente disfuncionais. Mas, se porĂ©m, a Corrupção servir somente a elite governativa para que se mantenha no “Poder” e, alĂ©m disso, os corruptores forem elementos externos ao sistema polĂ­tico nacional (veja-se o caso do colonialismo), Ă© provĂĄvel que o seu uso em larga escala crie, por um lado, tensĂ”es no seio das elites e, por outro lado, provoque reacçÔes nas massas, sendo estas de dois tipos, as activas como manifestaçÔes de revolta ou acçÔes armadas ou passivas como apatia e alheamento; portanto, a Corrupção Ă© um factor de desagregação e nunca de uniĂŁo do sistema.

Num sistema jurĂ­dico excessivamente formalista e burocratizado, a Corrupção pode, todavia contribuir para melhorar o funcionamento do sistema, tornando-o mais expedito, basta desbloquear certas e determinadas situaçÔes, tornando-se momentaneamente funcional, principalmente quando os obstĂĄculos de ordem jurĂ­dica impedem o desenvolvimento econĂłmico: No fundo, a Corrupção Ă© apenas um paliativo, mesmo neste sector. Sabemos que, sem qualquer sombra de dĂșvida, a sua influĂȘncia a longo prazo Ă© negativa, jĂĄ que, favorece uma zona em detrimento de outra.

A Corrupção, quando aparece num sistema em expansĂŁo e nĂŁo institucionalizado ou actue num sistema estĂĄvel e institucionalizado, Ă© um modo de influenciar as decisĂ”es pĂșblicas que minam e ferem, no Ă­ntimo, o prĂłprio sistema. De facto, este tipo privilegiado de influĂȘncia, quase sempre reservado Ă queles que possuem meios, a maioria das vezes somente financeiros, conduz ao desgaste dos recursos mais importantes do sistema, balizados entre a legitimidade e a autoridade.

Distinto leitor, caso (re)veja nestas parcas palavras algo que coincida com a realidade do seu PaĂ­s, nĂŁo ligue, pois Ă© mera coincidĂȘncia e nĂŁo Ă© esse o nosso propĂłsito primeiro.

Por: Carlos Fernandes de Carvalho
“escreve sem o acordo ortogrĂĄfico”

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